alt nov, 15 2025

Na madrugada de 30 de setembro de 2025, por volta das 3h48 em Brasília, Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), foi preso em flagrante dentro do Congresso Nacional. A prisão ocorreu ao final de nove horas de depoimento à CPMI do INSS, onde ele foi acusado de mentir deliberadamente pelo menos quatro vezes sobre descontos ilegais em benefícios de aposentados e pensionistas. O senador Carlos Viana (Podemos-MG), presidente da comissão, não escondeu a fúria: "Sei que nossa voz de prisão se repetirá, a pessoa será ouvida e liberada, mas há um grito na garganta de todos os brasileiros em relação a essa impunidade. O senhor está preso em nome dos aposentados, viúvas e órfãos do Brasil e aqui quem mente paga o preço."

Um esquema que roubou dos mais vulneráveis

Os documentos apresentados durante a sessão revelaram que, nos últimos cinco anos, a Conafer retirou mais de R$ 800 milhões das folhas de pagamento do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por meio de fichas de filiação falsas. A Controladoria-Geral da União (CGU) já havia identificado, em 2024, 100 dessas fichas — algumas em nome de pessoas já falecidas. Lopes, ao ser confrontado, alegou desconhecimento das operações. Mas isso foi exatamente o que irritou os parlamentares: ele não sabia, mas tinha poder absoluto. Como disse o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS), que formalizou o pedido de prisão: "Quem comanda não precisa assinar tudo. Só precisa permitir."

Libertado, mas ainda foragido

Horas após a prisão, Lopes foi liberado mediante pagamento de fiança — cujo valor nunca foi divulgado. Mas a história não terminou aí. Em 14 de novembro de 2025, a Polícia Federal divulgou os resultados da investigação: Lopes era o "líder e mentor intelectual do esquema criminoso". Ele não apenas sabia — ele ordenava. Mensagens apreendidas mostram que ele orientava funcionários a coletar assinaturas de idosos, muitas vezes sem seu conhecimento, para criar a ilusão de legalidade nos descontos.

Seu irmão, Tiago Abraão Ferreira Lopes, vice-presidente da Conafer, foi preso no mesmo dia. Entre 2019 e 2024, ele recebeu R$ 5,5 milhões diretamente da entidade. O núcleo financeiro era comandado por Cícero Marcelino de Souza Santos, preso também em 14 de novembro. Ele criou empresas de fachada para lavar o dinheiro. Em planilhas, os beneficiários das propinas eram chamados de "heróis" e "amigos". A crueldade é que esses "heróis" eram os próprios aposentados que, sem saber, financiavam o luxo de quem os explorava.

Quem mais está envolvido?

Além da família Lopes e de Cícero Santos, a investigação apontou o nome de Vinícius Ramos da Cruz, presidente do Instituto Terra e Trabalho (ITT), parceiro da Conafer em projetos. Ele ainda não foi preso, mas está sob vigilância. O Supremo Tribunal Federal (STF) também determinou a instalação de tornozeleira eletrônica em Ahmed Mohamad Oliveira Andrade, outro envolvido.

Na coletiva de imprensa, o senador Carlos Viana explicou que a CPMI não tem poder de decretação de prisão preventiva — só pode pedir. O pedido foi encaminhado ao ministro André Mendonça, relator do inquérito no STF. Até 14 de novembro, o mandado de prisão contra Lopes ainda não havia sido cumprido. Ele estava foragido. A Polícia Federal o considerava um dos principais alvos da operação, comparando seu papel ao de "Careca do INSS" — o famoso esquemista que movimentou bilhões nos anos 2000.

Por que isso importa para você?

Por que isso importa para você?

Esse não é só um caso de corrupção. É um roubo direto da aposentadoria de pessoas que trabalharam toda a vida. A cada R$ 1 milhão desviado, cerca de 300 aposentados deixam de receber seu benefício integral. A Conafer, que deveria defender os pequenos agricultores, se transformou em um canal de lavagem para elites que se aproveitaram da burocracia e da vulnerabilidade dos idosos.

Quem paga a conta? O cidadão comum, que vê seu imposto ser desviado. Quem sofre? A avó que precisa escolher entre remédio e alimentação. A viúva que não entende por que seu benefício diminuiu. E o pior: ninguém foi responsabilizado até agora. Lopes foi solto. Seu irmão foi preso, mas ainda não foi julgado. O dinheiro? Desapareceu.

O que vem a seguir?

O ministro André Mendonça ainda não decidiu sobre a prisão preventiva de Lopes. Mas a pressão cresce. A CGU já iniciou auditoria em todas as entidades que recebem descontos do INSS. O Tribunal de Contas da União pediu a suspensão de 17 contratos da Conafer. E o governo anunciou que vai criar um sistema de rastreamento em tempo real dos descontos associativos — algo que deveria existir há 20 anos.

Enquanto isso, a CPMI do INSS segue suas sessões. A próxima testemunha? Um ex-funcionário da Conafer que afirma ter sido pressionado a alterar documentos. Ele está em proteção. E a pergunta que todos fazem: quantos outros "Lopes" ainda estão em cargos públicos, escondidos atrás de nomes bonitos e discursos de defesa da família rural?

Frequently Asked Questions

Como o esquema da Conafer conseguia descontar dinheiro dos aposentados sem eles saberem?

A Conafer usava fichas de filiação falsas, obtidas com assinaturas de idosos — muitas vezes sem seu consentimento ou mesmo de pessoas já falecidas. Essas fichas eram apresentadas ao INSS como se os beneficiários fossem membros da entidade, permitindo descontos automáticos nas folhas de pagamento. A burocracia do sistema e a falta de checagem em tempo real facilitaram a fraude por anos.

Por que Carlos Lopes foi solto após a prisão em flagrante?

Apesar da prisão em flagrante por falso testemunho, a lei permite a liberação mediante pagamento de fiança, que não foi divulgada. A decisão foi tomada pelo juiz da CPMI, que considerou que o réu não representava risco imediato à ordem pública naquele momento. Mas isso não impediu o STF de emitir mandado de prisão preventiva semanas depois, quando a investigação revelou o esquema mais amplo.

Quem é responsável por decidir a prisão preventiva de Lopes?

A CPMI pode apenas solicitar a prisão preventiva. A decisão final cabe ao ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal, que atua como relator do inquérito. Ele analisa os riscos de fuga, obstrução da justiça e a possibilidade de recuperação dos recursos desviados. Ainda não houve decisão final, mas a pressão política é intensa.

Quantos aposentados foram afetados por esse esquema?

Não há um número exato, mas a CGU identificou mais de 100 fichas fraudulentas em 2024, e a Polícia Federal acredita que o esquema envolveu milhares de beneficiários ao longo de cinco anos. Com R$ 800 milhões desviados, estima-se que entre 15 mil e 20 mil aposentados e pensionistas tiveram seus benefícios reduzidos, mesmo que indiretamente, por esse desvio.

Existe risco de que o dinheiro desviado nunca seja recuperado?

Sim. O núcleo financeiro usou empresas de fachada e transferências complexas para esconder os recursos. Muito do dinheiro já foi gasto em imóveis, veículos e contas no exterior. A Justiça tenta bloquear ativos, mas a rastreabilidade é difícil. O governo estima que, no melhor cenário, apenas 30% a 40% do valor possa ser recuperado — o resto provavelmente se perdeu na sombra.

O que mudará a partir de agora para evitar novos esquemas como esse?

O governo anunciou a criação de um sistema de verificação em tempo real dos descontos associativos no INSS, com cruzamento automático de dados entre a CGU, a Receita Federal e as entidades. Além disso, a lei será alterada para exigir autorização expressa do beneficiário para qualquer desconto. Mas especialistas alertam: sem transparência e fiscalização constante, novas brechas surgirão — e sempre com o mesmo alvo: os mais vulneráveis.